O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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O Livro dos Espíritos.

(1ª edição)
(Idioma francês)

NOTAS

Nota XII — (Nº 268)

Como prova do que foi dito sobre a confusão de ideias que acompanham o primeiro momento da morte, e como confirmação de vários pontos essenciais da Doutrina Espírita, julgamos por bem citar aqui a evocação de um assassino por vingança e ciúme, e que até o derradeiro instante não havia manifestado arrependimento nem sensibilidade. Os sentimentos que ele exprime serão um ensino útil para os que duvidam do futuro da alma.
(O supliciado, após a evocação, responde): — Ainda estou preso ao corpo.
Tua alma ainda não se desligou completamente do corpo? — Não... tenho medo... não sei... Esperai que me reconheça... Não estou morto, não é mesmo?
Estás arrependido do que fizeste? — Fiz mal em matar, mas a isso fui levado por meu caráter, que não podia tolerar humilhações... Evocar-me-eis de outra vez.
Por que já queres ir embora? — Ficaria aterrorizado se o visse, pelo receio de que ele (sua vítima) me fizesse a mesma coisa.
Mas nada tens a temer, uma vez que tua alma está separada do corpo. Afasta toda inquietação, que não é razoável agora. — Que quereis? Acaso sois senhor de vossas impressões?... Não sei onde estou... Estarei louco?
Procura te acalmar. — Não posso, porque estou louco... Esperai!... Vou recobrar toda minha lucidez.
Se orasses, talvez pudesses concentrar teus pensamentos. — Tenho medo... não me atrevo a orar.
Ora, pois é grande a misericórdia de Deus! Oraremos contigo. — Sim, a misericórdia de Deus é infinita; sempre acreditei nela.
Agora compreendes melhor tua situação? — Ela é tão extraordinária que ainda não posso compreendê-la.
Vês tua vítima? — Parece-me ouvir uma voz semelhante à sua, dizendo-me: Não mais te quero. Será, talvez, efeito de minha imaginação? Estou louco, vo-lo asseguro, pois vejo meu corpo de um lado e a cabeça de outro... E, contudo, vejo-me no espaço, entre a Terra e o que denominais céu... Sinto como o frio de uma lâmina, prestes a me decepar o pescoço... Mas isso é o medo da morte... Também me parece ver uma multidão de Espíritos à minha volta, olhando-me compadecidos... Falam comigo, mas não os compreendo.
Haverá, porventura, entre esses Espíritos um cuja presença te humilhe por causa de teu crime? — Apenas um me apavora: o daquele a quem matei.
Lembras-te de tuas existências anteriores? — Não; tudo é vago... Creio sonhar. Ainda uma vez, preciso tornar a mim.
(Três dias mais tarde) — Tu te reconheces agora? — Sei que já não pertenço a esse mundo, e não o deploro. Lamento o que fiz, porém meu Espírito está mais livre. Sei, além disso, que há uma série de existências que nos dão conhecimentos úteis, a fim de nos tornarmos tão perfeitos quanto possível à criatura humana.
És punido pelo crime que cometeste? — Sim; é lamentável o que fiz e isso me faz sofrer.
De que maneira és punido? — Sou punido porque tenho consciência de minha falta, e para ela peço perdão a Deus; sou punido porque reconheço minha descrença em Deus, e porque sei que não devemos abreviar os dias de vida de nossos irmãos; sou punido pelo remorso de ter adiado meu progresso, enveredando por caminho errado, sem ouvir o grito da própria consciência que me dizia não ser pelo assassínio que alcançaria meu objetivo. Deixei-me dominar pela inveja e pelo orgulho; enganei-me e me arrependo, pois o homem deve esforçar-se sempre por dominar as más paixões, o que deixei de fazer.
Que sensação experimentas quando te evocamos? — De prazer e de temor, visto que não sou mau.
Em que consiste esse prazer e esse temor? — Prazer de conversar com os homens e poder em parte reparar minhas faltas, confessando-as; um temor que não posso definir, uma espécie de vergonha por ter sido assassino.
Desejas reencarnar na Terra? — Sim, eu o peço; desejo achar-me constantemente exposto ao assassínio, provando-lhe o temor.” 135



[135] N. T.: Trata-se do padre Verger, assassino do monsenhor Sibour, arcebispo de Paris, crime cometido quando este saía da Igreja de Saint-Étienne du Mont, após um ofício religioso. Condenado à morte e guilhotinado em 30 de janeiro de 1857, Verger foi evocado no mesmo dia da execução. Embora nessa época Allan Kardec ainda não tivesse plena consciência da real extensão de seus trabalhos ulteriores na Codificação do Espiritismo, julgou por bem conservar esses registros, obtidos antes e depois da publicação da 1ª edição de O Livro dos Espíritos e que, mais tarde, se mostraram de grande valia, como o prova esta evocação, inserida em 1865 em O Céu e o Inferno, 2ª parte, capítulo VI, ilustrando o tema “Criminosos arrependidos”.


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