O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano III — Junho de 1860.

(Idioma francês)

DITADOS ESPONTÂNEOS E DISSERTAÇÕES ESPÍRITAS.

Recebidos ou lidos nas sessões da Sociedade.

1. – A VAIDADE.

(Pela Sra. Lesc…, médium.)

Quero falar da vaidade, que se mescla a todas as ações humanas. Ela macula os mais suaves pensamentos; invade o coração e o cérebro. Planta maligna, abafa a bondade em seu nascedouro; todas as qualidades são aniquiladas por seu veneno. Para lutar contra ela, é preciso exercitar a prece; somente ela nos dá força e humildade. Homens ingratos! Esqueceis de Deus incessantemente. Ele não é para vós senão o socorro implorado na aflição, e jamais o amigo convidado para o banquete da alegria. Para iluminar o dia ele vos deu o sol, radiação gloriosa, e para clarear a noite, as estrelas, flores de ouro. Por toda parte, ao lado dos elementos necessários à Humanidade, pôs o luxo necessário à beleza de sua obra. Deus vos tratou como faria um anfitrião generoso que, para receber seus convidados, multiplica o luxo de sua mansão e a abundância do festim. Que fazeis vós, que tendes apenas o coração para lhe oferecer? Longe de o honrar com as vossas virtudes e alegrias, longe de lhe oferecer as premissas de vossas esperanças, não o desejais e somente o convidais a penetrar-vos o coração quando o luto e as decepções amargas vos trabalharam e deixaram marcas. Ingratos! Que esperais para amar vosso Deus? A desgraça e o abandono. Antes lhe oferecei o coração, livre de dores; oferecei-lhe, como homens em pé, e não como escravos ajoelhados, vosso amor purificado do medo, e na hora do perigo ele se lembrará de vós, que não o esquecestes na hora da felicidade.


GEORGES. (Espírito Familiar.)


2. – A MISÉRIA HUMANA.


A miséria humana não está na incerteza dos acontecimentos, que ora nos elevam, ora nos precipitam. Reside inteira no coração ávido e insaciável, que incessantemente aspira a receber, que se lamenta da secura de outrem e jamais se lembra da própria aridez. Essa desgraça de aspirar a mais alto que a si mesmo, essa desgraça de não poder satisfazer-se com as mais caras alegrias, essa desgraça, digo eu, constitui a miséria humana. Que importa o cérebro, que importam as mais brilhantes faculdades, se elas são sempre ensombradas pelo desejo amargo e insaciável de que algo lhe escapa sem cessar? A sombra flutua junto ao corpo, a felicidade flutua junto à alma, para ela inatingível. Não deveis, entretanto, nem vos lamentar, nem maldizer a sorte; porque essa sombra, essa felicidade, fugidia e móvel como a onda, pelo ardor e pela angústia que deposita no coração, dá-nos a prova da divindade aprisionada na Humanidade. Amai, pois, a dor e sua poesia vivificante, que faz vibrar vossos Espíritos pela lembrança da pátria eterna. O coração humano é um cálice repleto de lágrimas; mas vem a aurora, e beberá a água de vossos corações; para vós ela será a vida que deslumbrará vossos olhos, enceguecidos pela obscuridade da prisão carnal. Coragem! Cada dia é uma libertação; marchai na dolorosa senda; marchai, acompanhando com o olhar a maravilhosa estrela da esperança.

GEORGES. (Espírito Familiar.)


3. – A TRISTEZA E O PESAR.


(Pela Sra. Lesc…, médium.)

É um erro ceder frequentemente à tristeza. Não vos enganeis: o pesar é o sentimento firme e honesto que se apossa do homem atingido no coração ou nos interesses; mas a fastidiosa tristeza é apenas a manifestação física do sangue em sua lentidão ou rapidez de curso. A tristeza encobre com seu nome muito egoísmo, muitas fraquezas; debilita o Espírito que a ela se abandona. O pesar, ao contrário, é o pão dos fortes. Este amargo alimento nutre as faculdades do espírito e diminui a parte animal. Não procureis o martírio do corpo, mas sede ávidos pelo tormento da alma. Os homens compreendem que devem mover suas pernas e braços para manter a vida do corpo, mas não compreendem que devem sofrer para exercitar as faculdades morais. A felicidade, ou apenas a . alegria, são hóspedes tão passageiros da Humanidade que não podeis, sem ser por elas esmagados, suportar sua presença, por mais leve que seja. Fostes feitos para sofrer e sonhar incessantemente com a felicidade, porquanto sois aves sem asas, chumbados ao solo, que olhais o céu e desejais o espaço.

GEORGES. (Espírito Familiar.)


Observação. – Estas duas comunicações encerram, incontestavelmente, belíssimos pensamentos e imagens de grande elevação; mas nos parecem escritas sob o império de ideias um pouco sombrias e um tanto misantrópicas. Dir-se-ia haver nelas a expressão de um coração ulcerado. O Espírito que as ditou faleceu há poucos anos. Em vida era amigo do médium, do qual, após a morte, se tornou o gênio familiar. Era um pintor de talento, cuja vida tinha sido calma e muito despreocupada. Mas quem sabe se teria sido o mesmo na existência anterior? Seja como for, todas as suas comunicações atestam muita profundeza e sabedoria. Poderiam pensar que fossem o reflexo do caráter do médium. A Sra. Lesc… é, incontestavelmente, uma mulher muito séria e acima do vulgo, sob muitos aspectos, e é isso, sem dúvida – abstração feita à sua faculdade mediúnica – que lhe granjeia a simpatia dos bons Espíritos. Mas a comunicação seguinte, obtida na Sociedade, prova que pode receber outras de caráter muito variado.

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