O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano XI — Outubro de 1868.

(Idioma francês)

INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS.


Influência dos planetas nas perturbações do globo terrestre.

(Sumário)

1. — Extraímos o que segue de uma carta que nos é dirigida de Santa-Fé de Bogotá  †  (Nova Granada),  †  por um dos nossos correspondentes, o Sr. doutor Ignácio Pereira, médico, cirurgião, membro fundador do Instituto Homeopático dos Estados Unidos da Colômbia:


“Há três anos que, pela mudança das estações em nossas regiões, a do verão tornou-se muito longa e apareceram em algumas plantas doenças inteiramente desconhecidas em nosso país; as batatas foram atacadas de gangrena seca e, pelas observações microscópicas, que fiz em plantas afetadas por esta doença, reconheci que é produzida por um parasito vegetal [fungo] chamado perisporium solani. Há três anos nosso globo tem sido vítima de desastres de toda sorte: inundações, epidemias, epizootias, fome, furacões, comoções do mar, terremotos têm, sucessivamente, devastado diversas regiões.

“Sabendo que quando um cometa se aproxima da Terra as estações se tornam irregulares, pensei que esses astros pudessem igualmente produzir uma ação sobre os seres orgânicos, ocasionar perturbações climatéricas, causas de certas moléstias e, talvez, influir sobre o estado psíquico do globo pela produção de fenômenos diversos.

“O Espírito de meu irmão, que interroguei a respeito, limitou-se a me responder que não é um cometa que age, mas o planeta Júpiter que, de quarenta em quarenta anos, está no seu período mais próximo da Terra, recomendando-me não prosseguir este estudo por mim só.

“Preocupado com sua resposta, estudei a crônica de quarenta anos atrás, e então fiquei sabendo que as estações foram irregulares, como hoje, em nossas regiões; sobreveio ao trigo a doença conhecida pelo nome de anublo; também houve pestes nos homens e nos animais; terremotos que causaram grandes desastres.

“Esta questão me parece importante, razão por que, se julgardes conveniente submetê-la aos Espíritos instrutores da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, eu vos ficaria muito agradecido se me desse a conhecer a sua opinião.”


2. RESPOSTA.


(Paris, 18 de setembro de 1868.)

Na Natureza não há um fenômeno, por pouco importante que seja, que não seja regulado pelo exercício das leis universais que regem a criação. Dá-se o mesmo nos grandes cataclismos, e se males de toda sorte castigam a Terra em certas épocas, não só é porque são necessários, em razão de suas consequências morais, mas, também, porque a influência dos corpos celestes uns sobre os outros e as reações compostas de todos os agentes naturais devem fatalmente levar a tal resultado.

Estando tudo submetido a uma série de leis, eternas como aquele que as criou, pois que não se poderia remontar à sua origem, não há um fenômeno que não esteja submetido a uma lei de periodicidade, ou de série, que provoca o seu retorno em certas épocas, nas mesmas condições, ou seguindo, como intensidade, uma lei de progressão geométrica crescente ou decrescente, mas contínua. Nenhum cataclismo pode nascer espontaneamente, ou, se seus efeitos parecem tal, as causas que o provocam são postas em ação desde um tempo mais ou menos longo. Não, são, pois espontâneos senão em aparência, pois não há um só que não esteja preparado desde muito tempo, e que não obedeça a uma lei constante.

Partilho, pois, inteiramente da opinião expressa pelo Espírito de Jenaro Pereira [irmão do Dr. Ignácio Pereira], quanto à periodicidade das irregularidades das estações; mas quanto à sua causa, é mais complexa do que ele supõe.

Cada corpo celeste, além das leis simples que presidem à divisão dos dias e das noites, das estações, etc., sofrem revoluções que demandam milhares de séculos para a sua perfeita realização, mas que, como as revoluções mais breves, passam por todos os períodos, desde o nascimento até o apogeu do efeito, depois do que há um decréscimo até o último limite, para recomeçar em seguida a percorrer as mesmas fases.

O homem não abarca senão as fases de duração relativamente curta, e cuja periodicidade pode constatar; mas há umas que compreendem longas gerações de seres e, mesmo, sucessões de raças, cujos efeitos, por conseguinte, têm para ele as aparências da novidade e da espontaneidade, ao passo que se o seu olhar pudesse abranger alguns milhares de séculos para trás, ele veria, entre esses mesmos efeitos e suas causas, uma correlação que nem sequer suspeita. Esses períodos, que confundem a imaginação dos humanos por sua relativa duração, não são, contudo, senão instantes na duração eterna.

Lembrai-vos do que disse Galileu, em seus estudos uranográficos, que tivestes a feliz ideia de intercalar no vosso A Gênese, sobre o tempo, o espaço e a sucessão indefinida dos mundos, e compreendereis que a vida de uma ou de várias gerações, em relação ao conjunto, é como uma gota d'água no oceano. Não vos admireis, pois, de não poder perceber a harmonia das leis gerais que regem o Universo; o que quer que façais, não podeis ver mais que um pequeno canto do quadro, razão por que tantas coisas vos parecem anomalias.

Num mesmo sistema planetário, todos os corpos que dele dependem reagem uns sobre os outros; todas as influências físicas aí são solidárias, e não há um só dos efeitos, que designais sob o nome de grandes perturbações, que não seja a consequência da componente das influências de todo esse sistema. Júpiter tem suas revoluções periódicas, como todos os outros planetas, e essas revoluções não deixam de ter influência sobre as modificações das condições físicas terrestres; mas seria erro considerá-las como a causa única ou preponderante dessas modificações. Elas intervêm por uma parte, como as de todos os planetas do sistema, como os próprios movimentos terrestres intervêm para contribuir para modificar as condições dos mundos circunvizinhos. Vou mais longe: digo que os sistemas reagem uns sobre os outros, em razão da aproximação ou do afastamento que resulta de seu movimento de translação através das miríades de sistemas que compõem nossa nebulosa. Vou mais longe ainda: digo que nossa nebulosa, que é como um arquipélago na imensidade, tendo também o seu movimento de translação através de miríades de nebulosas, sofre a influência daquelas de que se aproxima. Assim, as nebulosas reagem sobre as nebulosas; os sistemas reagem sobre os sistemas, como os planetas reagem sobre os planetas, como os elementos de cada planeta reagem uns sobre os outros, e assim gradualmente, até o átomo. Daí, em cada mundo, as revoluções locais ou gerais, que só parecem perturbações porque a brevidade da vida não permite ver senão os seus efeitos parciais.

A matéria orgânica não poderia escapar a essas influências; as perturbações que ela sofre podem, então, alterar o estado físico dos seres vivos e determinar algumas dessas doenças que atacam de maneira geral as plantas, os animais e os homens. Como todos os flagelos, essas doenças são para a inteligência humana um estimulante que a impele, por necessidade, à procura dos meios de as combater, e à descoberta das leis da Natureza.

Mas, por sua vez, a matéria orgânica reage sobre o espírito; este, por seu contato e sua ligação íntima com os elementos materiais, também sofre influências que modificam suas disposições, sem, contudo, lhe tirar o livre-arbítrio, superexcitam ou retardam a sua atividade e, por isto mesmo, contribuem para o seu desenvolvimento. A efervescência, que por vezes se manifesta em toda uma população, entre os homens de uma mesma raça, não é uma coisa fortuita, nem o resultado de um capricho; tem sua causa nas leis da Natureza. Essa efervescência, a princípio inconsciente, que não passa de um vago desejo, uma aspiração indefinida por algo de melhor, uma necessidade de mudança, traduz-se por uma agitação surda, depois por atos que levam às revoluções morais, as quais, crede-o bem, também têm sua periodicidade, como as revoluções físicas, porque tudo se encadeia. Se a visão espiritual não fosse circunscrita pelo véu material, veríeis essas correntes fluídicas que, semelhantes a milhares de fios condutores, ligam as coisas do mundo espiritual e do mundo material.

Quando se vos diz que a Humanidade chegou a um período de transformação, e que a Terra deve elevar-se na hierarquia dos mundos, não vejais nestas palavras nada de místico, mas, ao contrário, a realização de uma das grandes leis fatais do Universo, contra as quais se quebra toda a má vontade humana.

Direi, em particular, ao Sr. Ignácio Pereira: Estamos longe de vos aconselhar a renúncia dos estudos que fazem parte de vossa futura bagagem intelectual; mas compreendeis, sem dúvida, que esses conhecimentos devem ser, como todos os outros, o fruto de vossos trabalhos, e não o de nossas revelações. Podemos dizer-vos: Estais perdidos, mas vós mesmos podeis eleger o verdadeiro caminho, cabendo a vós a iniciativa de levantar os véus em que ainda estão envolvidas as manifestações naturais que, até aqui, escaparam às vossas investigações, e descobrir as leis pela observação dos fatos. Observai, analisai, classificai, comparai, e da correlação dos fatos fazei as vossas deduções, mas não vos apresseis em concluir de modo absoluto.

Terminarei dizendo-vos: Em todas as vossas pesquisas tomai exemplo nas leis naturais, pois elas são todas solidárias entre si; e é esta solidariedade de ações que produz a imponente harmonia de seus efeitos. Homens, sede solidários, e avançareis harmonicamente para o conhecimento da felicidade e da verdade.


F. Arago. n


3. — Permiti-me acrescentar algumas palavras, como complemento, à comunicação que acaba de vos dar o eminente Espírito de Arago.

Sim, por certo a Humanidade se transforma, como já se transformou em outras épocas, e cada transformação é marcada por uma crise que é, para o gênero humano, o que são as crises de crescimento para os indivíduos; crises muitas vezes penosas, dolorosas, que arrastam consigo as gerações e as instituições, mas sempre seguidas de uma fase de progresso material e moral.

A Humanidade terrena, chegada a um desses períodos de crescimento, está plenamente, desde cerca de um século, no trabalho da transformação. É por isto que ela se agita por todos os lados, presa de uma espécie de febre e como que movida por uma força invisível, até que retome o equilíbrio sobre novas bases. Quem a vir, então, a achará muito mudada em seus costumes, em seu caráter, em suas leis, em suas crenças, numa palavra, em todo o seu estamento social.

Uma coisa que vos parecerá estranha, mas que não deixa de ser uma rigorosa verdade, é que o mundo dos Espíritos, que vos rodeia, sofre o contragolpe de todas as comoções que agitam o mundo dos encarnados; digo mais: ele aí toma uma parte ativa. Isto nada tem de surpreendente para quem quer que saiba que os Espíritos são unos com a Humanidade; que dela saem e a ela devem voltar; é, pois, natural que se interessem pelos movimentos que se operam entre os homens. Ficai, pois, certos de que quando uma revolução social se realiza na Terra, ela agita igualmente o mundo invisível; todas as paixões boas e más aí são superexcitadas como entre vós; uma indizível efervescência reina entre os Espíritos que ainda fazem parte do vosso mundo e que esperam o momento de nele entrar.

A agitação dos encarnados e dos desencarnados se juntam, por vezes e mesmo na maioria das vezes, porque tudo sofre, na Natureza, as perturbações dos elementos físicos; é então, por um tempo, uma verdadeira confusão geral, mas que passa como um furacão, depois do que o céu se torna sereno, e a Humanidade, reconstituída sobre novas bases, imbuída de novas ideias, percorre uma nova etapa de progresso.

É no período que se abre que se verá florescer o Espiritismo, e que dará os seus frutos. É, pois, para o futuro, mais que para o presente, que trabalhais; mas era necessário que esses trabalhos fossem elaborados previamente, porque preparam as vias da regeneração pela unificação e pela racionalidade das crenças. Ditosos os que os aproveitam desde hoje; será para eles tanto de ganho e de penas poupadas.


Doutor Barry.



[1] [v. François Arago.]


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