O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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Revista espírita — Ano XII — Abril de 1869.

(Idioma francês)


Há uma vida futura?

Opiniões diversas sobre este assunto, colhidas e ordenadas por um Fantasma. n

Para o maior número, não oferecendo dúvida a vida futura, uma demonstração se torna de certo modo supérflua, porque é mais ou menos como se se quisesse provar que o Sol se levanta todas as manhãs. Entretanto, como há cegos que não veem o Sol se levantar, é bom saber como se lhes pode provar; ora, é a tarefa que empreendeu o Fantasma, autor deste livro. Este Fantasma é um ilustre engenheiro, que conhecemos de nome, por outras obras filosóficas que trazem o seu nome; mas, como não quis associá-lo ao nome por que era conhecido, não nos julgamos no direito de cometer uma indiscrição, embora saibamos perfeitamente que ele não faz nenhum mistério de suas crenças.

Este livro prova, uma vez mais, que a Ciência não conduz fatalmente ao materialismo, e que um matemático pode ser um firme crente em Deus, na alma, na vida futura em todas as suas consequências.

Não é uma simples profissão de fé, mas uma demonstração digna de um matemático, por sua lógica cerrada e irresistível. Também não é uma dissertação árida e dogmática, mas uma polêmica orientada sob a forma de conversação familiar, na qual os prós e os contras são imparcialmente discutidos.

Conta o autor que, assistindo ao enterro de um de seus amigos, pôs a conversar em caminho com vários convidados. As circunstâncias e as peripécias da cerimônia levaram a conversa para a sorte do homem após a morte. Inicialmente ela se travou com um niilista, ao qual ele se propôs demonstrar a realidade da vida futura por argumentos encadeados com uma arte admirável e, sem o chocar ou ferir, conduzi-lo naturalmente às suas ideias.

Junto ao túmulo são pronunciados dois discursos num sentido diametralmente oposto sobre a questão do futuro, e produzem impressões diferentes. De volta, os novos interlocutores se juntam aos dois primeiros; acordam reunir-se em casa de um deles, e lá se trava uma polêmica séria, na qual as diversas opiniões fazem valer as razões sobre as quais se apoiam.

Este livro, cuja leitura é atraente, tem todo o encanto de uma história, e toda a profundeza de uma tese filosófica. Adiantaremos que, entre os princípios que preconiza, não encontramos um só em contradição com a Doutrina Espírita, na qual o autor deve ter-se inspirado.

A necessidade da reencarnação para o progresso, sua evidência, sua concordância com a justiça de Deus, a expiação e a reparação pelo reencontro dos que se prejudicaram numa precedente existência, aí são demonstradas com uma clareza surpreendente. Vários exemplos citados provam que o esquecimento do passado, na vida de relação, é um benefício da Providência, e que esse esquecimento momentâneo não impede tirar proveito da experiência do passado, visto que a alma se recorda nos momentos de desprendimento.

Eis, em poucas palavras, um dos fatos contados por um dos interlocutores e que, segundo ele, lhe é pessoal:

Era aprendiz numa grande fábrica; por sua conduta, inteligência e caráter, granjeou a estima e a amizade do patrão que, em consequência, o torna sócio de sua casa. Vários fatos, dos quais então não se dava conta, provam nele a percepção e a intuição das coisas durante o sono; essa faculdade até lhe serviu para prevenir um acidente que poderia ter consequências desastrosas para a fábrica.

A filha do patrão, encantadora menina de oito anos, lhe testemunhava afeição e se divertia com ele; mas, cada vez que ela se aproximava, ele sentia um frio glacial e uma repulsa instintiva; seu contato lhe fazia mal. Pouco a pouco, no entanto, tal sentimento se abrandou, depois se apagou. Mais tarde a desposou. Ela era boa, afetuosa, previdente e a união era muito feliz.

Uma noite ele teve um sonho horrível. Via-se na sua precedente encarnação; sua mulher se havia conduzido de maneira indigna e tinha sido a causa de sua morte, mas, coisa estranha! ele não podia dissociar a ideia dessa mulher da sua atual esposa; parecia-lhe que era a mesma pessoa. Perturbado por essa visão ao despertar, ficou triste; pressionado pela mulher para lhe dizer a causa, decidiu-se a contar o seu pesadelo. “É singular, disse ela, tive um sonho semelhante, e eu é que era a culpada.” As circunstâncias fazem que ambos reconheçam não estarem unidos pela primeira vez; o marido explica a repulsa que tinha pela esposa, quando esta era menina; a mulher redobra de cuidados para apagar o passado; mas já está perdoada, porque a reparação se deu e o enlace continua a ser próspero.

Daí a conclusão: que esses dois seres se encontravam novamente unidos, um para reparar, o outro para perdoar; que se tivessem tido a lembrança do passado, teriam fugido um do outro e perdido o benefício, um o da reparação, o outro o do perdão.

Para dar uma ideia exata do interesse deste livro, seria preciso citá-lo quase por inteiro. Limitar-nos-emos à passagem seguinte:


“Perguntais se creio na vida futura, dizia um velho general; se cremos, nós, soldados! E como quereis que não seja assim, a menos que sejamos um tríplice animal? Em que quereis que pensemos na véspera de um combate, de um assalto, que tudo prenuncia que deve ser mortífero?… Depois de ter dito adeus, em pensamento, aos seres queridos, que estamos ameaçados de deixar, voltamos irresistivelmente aos ensinos maternos, que nos mostraram uma vida futura, na qual os seres simpáticos se reencontram. Colhemos nessas lembranças um redobramento de coragem, que nos faz afrontar os maiores perigos, conforme o nosso temperamento, com calma ou com uma certa exaltação e, mais vezes, ainda, com um entusiasmo, uma alegria, que são os traços característicos do exército francês.

“Afinal de contas, nós somos descendentes desses bravos gauleses, cuja crença na vida futura era tão grande, que tomavam emprestadas vastas somas de dinheiro para reembolsar numa outra existência. Vou mais longe: estou persuadido de que somos sempre os filhos da velha Gália que, entre a época de César e a nossa, atravessaram grande número de existências, em cada uma das quais tomaram um grau mais elevado nas falanges terrenas.”

Este livro será lido com proveito pelos mais firmes crentes, porque aí colherão novos argumentos para refutar seus adversários.



[1] I vol. in-12; 3 fr. [Y a-t-il une vie future ? : Opinions diverses sur ce sujet - Google books.]


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