O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Os mensageiros — André Luiz


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Pavor da morte

(Sumário)

1. Numerosas explicações do orientador atendiam-me às indagações naturais; no entanto, restava aprender alguma coisa. 2 Por que motivo se reuniam ali tantos desencarnados? Já que recebiam assistência espiritual, não poderiam congregar-se em lugares igualmente espirituais?

3 Respeitosamente, interroguei Aniceto nesse sentido.

— De fato, André, — respondeu o mentor generoso, — a maioria dos desencarnados recebe esclarecimentos justos em nossa Esfera de ação. 4 Você mesmo, nos primórdios da nova experiência espiritual, não foi conduzido ao ambiente de nossos amigos corporificados para o necessário encaminhamento. 5 Grande número de criaturas, porém, na passagem para cá, sentem-se possuídas de “doentia saudade do agrupamento”, como acontece, noutro plano de evolução, aos animais, quando sentem a mortal “saudade do rebanho”. 6 Para fortalecer as possibilidades de adaptação dos desencarnados dessa ordem ao novo “habitat”, o serviço de socorro é mais eficiente, ao contato das forças magnéticas dos irmãos que ainda se encontram envolvidos nos Círculos carnais. 7 Esta sala, em momentos como este, funciona como grande incubadora de energias psíquicas, para os serviços de aclimação de certas organizações espirituais à vida nova.

8 E, designando a grande assembleia de necessitados, continuou:

— Os irmãos, nas condições a que me refiro, ouvem-nos a voz, consolam-se com o nosso auxílio, mas o calor humano está cheio dum magnetismo de teor mais significativo, para eles. Com semelhante contato, experimentam o despertar de forças novas. 9 Por isso, o trabalho de cooperação, em templos desta espécie, enseja proporções que você, por agora, não conseguiria imaginar. 10 Não observou os preguiçosos, os dorminhocos e invigilantes que vieram colher benefícios nesta casa? Pois eles também deram alguma coisa de si. Deram calor magnético, irradiações vitais proveitosas aos benfeitores deste santuário doméstico, que manipulam os elementos dessa natureza, distribuindo-os em valiosas combinações fluídicas às entidades combalidas e inadaptadas.

11 E, sorrindo, concluiu, bondoso:

— Tudo tem algum proveito, André. Nosso Pai nada cria em vão.


2. Terminada a reunião com benefícios gerais, que não me cabe descrever pormenorizadamente, atendeu Aniceto ao facultativo desejoso de aproveitar-lhe o concurso nobre, junto aos clientes.

2 — Grande número de vezes, — exclamou o receitista do grupo de Dona Isabel, como a prestar informações a Vicente e a mim, — não só ministramos medicação aos corpos doentes, mas também orientamos os desencarnados que, no curso da moléstia, se encontram sob nossa assistência.

3 — E são sempre muitos? — Indaguei.

— Número crescente, — elucidou, atencioso. Há ocasiões em que contamos com a cooperação de amigos ou parentes espirituais dos enfermos; mas, na maioria dos casos, somos forçados a agir por nós mesmos. 4 Felizmente, quase nunca estamos sem auxiliares dedicados e ativos. Há companheiros que se consagram a cuidar de tuberculosos, cegos, aleijados, leprosos, perturbados e moribundos, isoladamente. São eles nossos devotados colaboradores em todas as situações.

5 Puséramo-nos a caminho e, a breves minutos, estacionávamos diante dum edifício de vastas proporções.

O colega, gentil, conduziu-nos ao interior de silencioso necrotério, onde defrontamos um quadro interessante. 6 O cadáver de uma jovem, de menos de trinta anos, ali jazia gelado e rígido, tendo a seu lado uma entidade masculina, em atitude de zelo. 7 Com assombro, notei que a desencarnada estava unida aos despojos. Parecia recolhida a si mesma, sob forte impressão de terror. Cerrava as pálpebras, deliberadamente, receosa de olhar em torno.

8 — Terminou o processo de desligamento dos laços fisiológicos, — exclamou o facultativo atento, — mas a pobrezinha há seis horas que está dominada por terrível pavor.

9 E apontando o cavalheiro desencarnado, que permanecia junto dela, cuidadoso, o receitista esclareceu:

— Aquele é o noivo que a espera, há muito.

Aproximamo-nos um tanto e ouvimo-lo exclamar carinhosamente:

— Cremilda! Cremilda! Vem! Abandona as vestes rotas. Fiz tudo para que não sofresses mais… Nossa casinha te aguarda, cheia de amor e luz!…

10 A jovem, todavia, cerrava os olhos, demonstrando não querer vê-lo. Notava-se, perfeitamente, que seu organismo espiritual permanecia totalmente desligado do vaso físico, mas a pobrezinha continuava estendida, copiando a posição cadavérica, tomada de infinito horror.

11 Aniceto, que tudo pareceu compreender num abrir e fechar de olhos, fez leve sinal ao rapaz desencarnado, que se aproximou comovido.

— É preciso atendê-la doutro modo, — disse o nosso orientador, resoluto, — vejo que a pobrezinha não dormiu no desprendimento e mostra-se amedrontada por falta de preparação espiritual. 12 Não convém que o amigo se apresente a ela já, já… Não obstante o amor que lhe consagra, ela não poderia revê-lo sem terrível comoção, neste instante em que a mente lhe flutua sem rumo…

13 — Sim, — considerou ele, tristemente, — há seis horas chamo-a sem cessar, identificando-lhe o terror.

Redarguiu Aniceto, conselheiral:

— Ausência de preparação religiosa, meu irmão. Ela dormirá, porém, e, tão logo consiga repouso, entregá-la-emos aos seus cuidados. Por enquanto, conserve-se a alguma distância.

14 E fazendo-se acompanhar do facultativo, que assistira espiritualmente a jovem nos últimos dias, aproximou-se da recém-desencarnada, falando com inflexão paternal:

— Vamos, Cremilda, ao novo tratamento.

15 Ouvindo-o, a moça abriu os olhos espantadiços e exclamou:

— Ah, doutor, graças a Deus! Que pesadelo horrível! Sentia-me no Reino dos Mortos, ouvindo meu noivo, falecido há anos, chamar-me para a Eternidade!…

16 — Não há morte, minha filha! — Objetou Aniceto, afetuoso, — creia na vida, na vida eterna, profunda, vitoriosa!

— É o senhor o novo médico? — Indagou, confortada.

— Sim, fui chamado para aplicar-lhe alguns recursos em bases magnéticas. Torna-se indispensável que durma e descanse.

— É verdade… — tornou ela de modo comovente, — estou muito cansada, necessitando repouso…

17 Recomendou-nos o instrutor, em voz baixa, prestássemos auxílio, em atitude íntima de oração, e, depois de conservar-se em silêncio por instantes, ministrou-lhe o passe reconfortador. A jovem dormiu quase imediatamente.

18 Deslocou-a Aniceto, afastando-a dos despojos, com o zelo amoroso dum pai, e, chamando o noivo reconhecido, entregou-a carinhosamente.

— Agora, poderá encaminhá-la, meu irmão.

19 O rapaz agradeceu com lágrimas de júbilo e vi-o retirar-se de semblante iluminado, utilizando a volição, a carregar consigo o fardo suave do seu amor.

20 Nosso mentor fixou um gesto expressivo e falou:

— Pela bondade natural do coração e pelo espontâneo cultivo da virtude, não precisará ela de provas purgatoriais. É de lamentar, contudo não se tivesse preparado na educação religiosa dos pensamentos. Em breve, porém, ter-se-á adaptado à vida nova. Os bons não encontram obstáculos insuperáveis.

21 E, desejoso talvez de consubstanciar a síntese da lição, rematou:

— Como veem, a ideia da morte não serve para aliviar, curar ou edificar verdadeiramente. É necessário difundir a ideia da vida vitoriosa. Aliás, o Evangelho já nos ensina, há muitos séculos, que Deus não é Deus de mortos, ( † ) e, sim, o Pai das criaturas que vivem para sempre.


André Luiz


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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